Semiparlamentarismo explode com pautas-bomba e Ponte para o Futuro vira túnel para o passado
Visto por alguns como um arranjo engenhoso para os impasses políticos do país, o arremedo de semiparlamentarismo que teria se instalado após o afastamento da presidente Dilma Rousseff possuiria o vantajoso condão de controlar excessos do Executivo e ao mesmo tempo incorporar a agenda reformista que impulsionou Michel Temer em sua aventura conspiratória.
Nos termos do acordão que presidiu a virada de mesa iniciada em dezembro de 2015, o Congresso ganharia margem para tentar estancar a sangria da Lava Jato e aceitaria, em contrapartida, promover a pauta liberal do documento Ponte para o Futuro –empreendimento que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso apoiou, mas chamou, sem perder sua peculiar sagacidade, de “pinguela”.
A aprovação inicial de meia dúzia de reformas serviu para animar os entusiastas da empreitada, que passaram a minimizar os conhecidos traços do DNA de nossa maioria parlamentar, entre os quais o fisiologismo desenfreado, o oportunismo, a miséria moral, a demagogia e a inclinação populista de direita. Mesmo diante de manifestações deploráveis, como os aumentos em cascata concedidos por Temer logo no começo de sua gestão, acreditou-se que o “ soi-disant” semiparlamentarismo seria uma fórmula virtuosa.
Pois bem: não demorou muito para que o escorpião, como na parábola, acabasse por picar o sapo. Ao comprar da malta congressista sua permanência no cargo, Temer tornou-se um fantoche nas mãos do centrão e das bancadas empenhadas em lobbies diversos, no mais das vezes regressivos.
A possibilidade de que o populismo de direita triunfasse, sempre alta, materializou-se. O sistema improvisado, que serviria para ajudar o país a conter gastos, equilibrar contas e caminhar na direção de uma economia e de uma administração pública mais modernas e racionais, passou a fazer o contrário.
Sob os eflúvios do período eleitoral, com um presidente entregue às baratas, o semiparlamentarismo não aprovou a propalada reforma da Previdência, ampliou despesas e transformou-se no reinado do atraso e da irresponsabilidade.
Após uma sequência de concessões, que envolveu perdão de dívidas e benesses variadas para grupos de interesse, chegou-se ao fim da linha com a greve dos caminhoneiros. Fruto, entre outros motivos, da fragilidade do presidente e do devaneio mercadista imprudente da nova política de preços da Petrobras, a paralisação resultou em desfalque para a atividade econômica, os cofres públicos e o bolso do contribuinte.
Não bastassem os prejuízos, concedeu-se anistia aos grevistas mancomunados com empresas do setor e aprovou-se um inacreditável tabelamento do frete, em meio a pautas-bomba (sim, elas voltaram) que podem empurrar para 2019 despesas de cerca R$ 90 bilhões, segundo estimativa de reportagem desta Folha.
A ponte para o futuro virou túnel para o passado e o semiparlamentarismo parece ser o responsável pela engenharia.
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FOTO AO ALTO – Eunício Oliveira (MDB-CE), presidente do Congresso, durante debate sobre a lei orçamentária –