Baixo Augusta lança Carnaval político que revive 1968 e terá homenagem a Judith Butler

Marcos Augusto Gonçalves

Com o lançamento de um festival de shows, festas e outras atividades, o bloco Acadêmicos do Baixo Augusta dá a largada, nesta quinta (11/1), para o Carnaval deste ano, que promete unir alegria e política e se transformar numa grande manifestação de rua, no dia 4 de fevereiro.

“Será uma manifestação política com alegria, com desbunde e com transgressão, que é a melhor maneira que a gente encontra de responder a esse discurso de ódio que alguns setores da sociedade tentam instalar”, diz o produtor cultural  Alê Youssef, diretor da associação.

Sob o lema “É Proibido Proibir”, o bloco, com sua tradicional pegada progressista e ativista, vai ter quatro trios elétricos, performances, artistas famosos e até uma encenação da companhia de teatro Os Satyros baseada na obra da filósofa americana Judith Butler –que foi alvo de ataques de grupos ultraconservadores quando esteve recentemente no Brasil (por supostamente querer implantar uma imaginária “ideologia de gênero” nas escolas).

Em conversa com o blog, Youssef falou do desfile deste ano e também do sentido da festa, que a seu ver é a melhor representação da identidade brasileira.

Blog – Neste ano o Carnaval vem mais politizado?

Youssef – Este ano a relação do Carnaval com a política vai ser muito marcante. Nós acreditamos que o Carnaval, mais do que qualquer outra instituição, dá um senso de continuidade para o país. Entre o Carnaval passado e o que se avizinha nós presenciamos absurdos que contrariam a própria identidade do Brasil que o Carnaval representa.

O Baixo Augusta vai tocar nesses assuntos de maneira bastante contundente e vai mostrar através de seu desfile como que o obscurantismo e o proibicionismo de certos grupos da sociedade são discursos de ocasião.

A gente pretende escancarar a nossa opinião e a nossa contrariedade em relação ao que vimos acontecer ao longo do ano no campo do proibicionismo, lembrando que um dos aspectos que mais nos marcou foi a proibição, em 2017, da ocupação da praça Roosevelt pelo festival “Satyrianas”, que tem mais de 20 anos e  é um marco zero da ideia do Baixo Augusta, da ideia do nosso bairro.

Todos esses elementos farão do nosso Carnaval uma grande manifestação política, mas uma manifestação política com alegria, com desbunde, com transgressão, que é a melhor maneira que a gente encontra de responder a esse discurso de ódio que alguns setores da sociedade tentam instalar.

Blog – “É Probido Proibir” faz referência aos 50 anos de Maio de 68 e também à apresentação da música de Caetano Veloso, acompanhado pelos Mutantes, que ficou famosa por um discurso em reação às vaias da plateia…

Youssef – Além dessas duas referências, importantíssimas, o tema também lembra outros episódios, como os 50 anos da batalha da Maria Antônia e da censura à canção “Para Não dizer que Não Falei de Flores”. O tema reúne uma série de simbolismos que vão se encontrar e serão ressaltados no desfile.

Blog – Como vai ser o desfile?

Youssef – Nós vamos concentrar na Consolação com a Paulista a partir das 14h e sair em torno das 16h. Vão ser quatro trios elétricos. Teremos um ato de abertura, com a leitura de um manifesto e algumas surpresas. Teremos também uma performance da atriz Alesandra Negrini relacionada à ideia de censura versus liberdade.

Vamos fazer um ato na rua Maria Antônia, no qual lembraremos todas essas referências históricas  mencionadas. Além disso, vamos inaugurar um grande painel na empena inteira do prédio onde se situa a Casa do Baixo Augusta, com o tema do ano. Para pintar esse mural, vamos ter o reencontro do Ciro Cozzolino, do Carlos Delfino e do Zé Carratu, do grupo Tupinãodá, criado em 1983 [uma lenda oitentista do grafite na cidade].

Blog – O Carnaval de rua de São Paulo tem um perfil mais ativista?

Youssef – O Carnaval de São Paulo é na sua essência ativista, um Carnaval que se moldou na dificuldade de colocar o bloco na rua. Várias gestões foram proibicionistas nesse sentido e a partir disso a gente entendeu que era necessário adotar um tom de ativismo, no sentido de ocupar e disputar a cidade. Isso marcou o Carnaval de rua de São Paulo e especialmente o Baixo Augusta.

Nós sempre tivemos temas e sempre fomos um bloco que colocou suas opiniões muito fortemente nos desfiles. Foi assim contra o Estatuto da Família; no “Flower Power”, depois das manifestações de 2013; no “Ocupa Augusta”, com a caveira guerrilheira; e no “A Cidade é Nossa”, no início do governo Doria, para mostrar que as conquistas civilizatórias de ocupação da cidade tinham que ser mantidas. E vai ser assim no “É Proibido Proibir” para confrontar o proibicionismo e o conservadorismo.